domingo, 26 de dezembro de 2010

Feliz Ano Novo para todos os que acompanham Artes e artes!

Reflexões sobre o Ano Novo

Maria J Fortuna

Está quase estourando o Ano Novo por aqui! Todos os anos a mesma expectativa, alegria e sentimento de esperança! Aí vem pensamentos: para alguns, banhados de grande dose de otimismo; para outros, cuja expectativa é muito grande, um simples repeteco do que aconteceu nos anos anteriores.
Pelo meu lado, continuo sonhando com a Paz.
Que os passarinhos continuem cantando, as crianças brincando e que o ser humano se reconheça na simplicidade, de onde vem o mistério. E que as estórias de fadas e duendes grassem pelas avenidas da alma, anunciando o sonho, e que aceitemos as mudanças do outro, porque passamos a acreditar em nossa própria mudança.
Sinto que nós, seres humanos, somos cebolas ambulantes, que vão largando as cascas na medida em que vão amadurecendo. Para evitar o sumo da cebola, que nos faz chorar, podemos imaginar cada dia como novo nascimento – tipo casulo, onde a lagarta vai, primeiro construindo um lugar onde possa crescer e se transformar em paz. Num segundo momento, dentro dessa proteção, vivencia o silêncio da morte, da desesperança aparente. Por último, sair por aí voando, na ilusão que a beleza de suas asas traz. Conseguindo, por vezes, ofuscar o perigo ao transformar-se de frágil em poderoso e expondo-se aos quatro ventos!
Na verdade, eu gostaria que Israel fizesse as pazes com a Palestina, e que a Coréia do Norte mandasse aquele ditador baixinho para as cucuias. Vamos pedir ao Espírito Santo, juízo para Mahmoud Ahmadinejad. E que aquele povo pare de apedrejar mulheres e sinta que o amor e compaixão estão acima da Lei. E que não haja mais este tipo de barbárie sobre a face da Terra, que precisa muito de trégua, de descanso, de ser menos sugada e destruída!
E que morra o preconceito, fruto da imaturidade ou de uma deseducação dada por antepassados, que passaram a vida na Terra mas não reconheceram a Luz.
Tomara que, neste novo ano, tenhamos mais consciência do ser que habita em nosso centro. Com isso impeçamos a própria destruição. E que paremos de culpar os outros pelos nossos pecados. Tomemos a responsabilidade por nossas vidas e ações nas mãos e deixemos que o coração ocupe o lugar onde sempre esteve: no peito da gente, bem no centro. Como naquele filme do ET , que achamos tão feio, com coração luminoso que palpitava, acendendo e apagando sua luz própria.
Mais amor e compaixão para que haja misericórdia e perdão. Mais fé e reconhecimento de todo amor que, com certeza, temos para dar.
Assim acredito que estaremos em PAZ em 2011!

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Pessoal, na revista internética João do Rio, http://www.joaodorio.com/site/index.php, você encontra contos de João do Rio, Abilio Pacheco, André Viana, Lima Barreto e outros. E crônicas bem atuais de Gilson Nazareth, Peregrino Junior,Domi Chirongo, etc.
Maria J Fortuna faz parte desse bloco de cronistas.
Neste número em Crônicas Cariocas: Na Igreja de Sto. Antônio...
Na revista a gente encontra também, dentre outras novidades, Haicais, poesias e entrevistas. Apareçam por lá!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Outro dia para o Natal de Jesus







Maria J Fortuna

Estou cansada, sabe? Todos os anos é a mesma coisa... Pessoas se atropelando nas ruas, na compra de presentes, um clima assim, como direi? Genuinamente comercial. Papai Noel para tudo o quanto é lado... A cidade vestida de cores através de suas lâmpadas, que abraçam prédios e árvores. Um rebuliço só!
Ainda posso me refugiar na Missa do Galo, no Mosteiro de São Bento, aqui no Rio, nessa data. Mas a Praça Mauá, á noite, é um tanto quanto perigosa... Com carro ou sem carro. Vou ter que abrir mão de ouvir os cânticos maravilhosos dos monges beneditinos, do perfume de incenso que me lembra a infância, que pena! Não creio que, fora daquela liturgia, eu possa sentir o verdadeiro espírito cristão. Pelo menos coletivamente.
Daqui a algum tempo, esta festa vai ser tão descaracterizada quanto o dia de Ação de Graças nos EEUU. Apenas invoca a paz e reúne as pessoas da família, alguns amigos para comer o peru, rodeado de delícias ou não. Com um enorme pinheiro enfeitado com bolas fluorescentes e luzes, ou não...
Ficará a tradição da festa vermelha e verde. As crianças vão ouvir que outrora, naquela data, celebrava-se o nascimento de certo Cristo. Reinará, então, o velhinho que emite aquele som: Ho Ho Ho e traz presente para os pequenos, ou não... Afinal toda celebração tem que ter o celebrado. Tem que ter um rei. Afinal, há tempos, Papai Noel é candidato ao papel principal. E vem ganhando disparado! Ouçam suas musiquetas, tocando incansavelmente por toda parte, como propaganda eleitoral! Principalmente dentro das grandes lojas e Shoppings. Viva Papai Noel, que aparece abastado, pançudo, emitindo os tais sons natalinos!
Precisamos, urgentemente, procurar outra data para comemorarmos o Natal de Jesus! Vinte e cinco de dezembro não está dando mais! Mesmo porque, a data não pode se restringir à comemoração nos templos cristãos. Dizem que o culpado de colocar este dia como seu nascimento, foi Constantino. Mas faz muito tempo... Vamos abrir os olhos... Afinal, como Deus, Profeta, Arquetípico, ou o que seja, na diversidade de interpretações, foi Ele quem nos trouxe, em sua doutrina de amor e perdão, um novo paradigma para a humanidade! Chega de “olho por olho,dente por dente!” De briga entre as religiões, que se desenvolvem na intolerância de seus dogmas. Não basta a Lei, precisamos da Graça!
Sem abrir o coração, ninguém pode comemorar seu Natal. Quem sabe elegeremos o mês de março para a memorável data? Longe de Papai Noel. Dizem os estudiosos e alguns agnósticos conhecidos e reconhecidos, que Ele é pisciano. Vou ficar muito feliz com esta confirmação, porque também sou do signo de Peixes. E, para mim, Jesus é Luz, em seu estado mais límpido e brilhante, que ultrapassa todos os limites humanos e nos traz as verdadeiras lições de amor e humildade. Uma importante proposta para transformar os corações e salvar o planeta. Que acham?

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010


Recebi de Eliane Accioly, o prêmio Dardos. Agradeço o incentivo e o apoio que tem dado a Artes e artes. Este prêmio favorece tanto aos blogueiros quanto as pessoas que desejam ler blogs éticos, criativos e de bom gosto. E creio que precisamos muito disso.

Blogs premiados:

http://agoraoununca-light.blogspot.com/

http://zmauricio.blogspot.com/

http://anajacomo.blogspot.com/

http://dimansinho.blogspot.com/

http://delasnievedaspet.blogspot.com/

Geraldo Eustáquio de Souza
José Mauricio Guimarães
Ana Claudia Saldanha Jácomo
Monica Puccinelli
Delasnieve Daspet

Pérouges



Não podia deixar de mostrar uma foto de Pèrouges, onde fica o Atelier de Annete Queyras Winckler

Annette Queyaras e seus violinos







Quando estive na pequena cidade medieval de Pérouges, vila medieval da região francesa do Ródano-Alpes. A vila, lozalizada no alto de uma colina circundada por muralhas do século 12, conservou sua arquitetura da Idade Média. Lá eu vi pela primeira vez o atelier de Annette Queyras Winckler, artista plástico cuja a inspiração em instrumentos musicais, leva-o a conceber variações sobre o tema. Interessante e bonito o trabalho desse artista!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A marca de Caim








Maria J Fortuna


Ela era de uma coragem a toda prova, mas tinha o coração de casca de ovo. Não era a toa que abria mão das coisas que poderiam fazer-lhe feliz... Talvez por isto, de vez em quando, tinha acessos de loucura. Havia dia que queria medir o vento. Noutro, queria ficar nua para beber água da chuva. Mas tinha consciência do seu estado emocional descompassado... Lambia seus sonhos como último refúgio para ficar um pouco contente. Tocava o sexo para aliviar tensões e esquecer o medo. Ah! As fantasias que corriam soltas como redemoinho em sua mente cansada... Depois... Bem, depois não sabia o que fazer de si mesma. Não podia esquecer que seu traço louco era sua marca de Caim. Deus puniu Caim, mas o protegeu. E ele foi pai de muitas gerações com nome na Bíblia e tudo. Deus podia protegê-la, mas não do seu traço doente, dos pensamentos obsessivos que lhe assaltavam a mente com tal intensidade que chegavam a paralisar seu curso de vida, já tão sacrificado. O jeito que tinha era acolher e conviver com a loucura, porque não tinha outra saída. Assim foi vivendo, esperando que a lua se apagasse com a chegada do sol. Com uivos de lobo aos seus ouvidos. Chegou a ponto de sentir apagada a Luz de Deus. E todo o seu universo ficou às escuras dias e dias... Quando indagava porque tanto suplicio, a resposta era sempre a mesma: não tinha resposta.
Os anos se passando e a dor continuando. As amigas casando, os filhos dos outros crescendo e ela ali a ver navios... Louca para trançar seu corpo num corpo de homem em que, nus, podiam se abraçar e espantar seus pesadelos em noites sombrias... Mas não iria adiantar. Homem nenhum agüentaria presença tão distante quando a obsessão a carregava do mundo em sua presença de sombra. Levantava a noite e escrevia: “- Por que é assim comigo? Que mal fiz pelo amor do santíssimo nome de Cristo?” Até que um dia seu pensamento a seduziu com uma sugestão: “- Ignore seus delírios e diga para si mesma que você não se identifica com eles...” De certa forma foi um alivio. ”- Não sou esta face doente que me atormenta, sou bem maior do que ela! “, repetia mentalmente. Mas o traço doente veio dos antepassados e tinha muito poder sobre ela! Trazia nos genes aquela loucura coletiva, herança maldita em algum antepassado... Avós, bisavós, tataravós... Quem? Alguém que tinha aquela marca de Caim. O que poderia nascer disso tudo? Seria escrava dos comprimidos que amenizavam apenas amenizavam o medo que causava a maldição?
Aconteceu numa noite de insônia. Mergulhou as mãos numa argila que estava abandonada num fosso perto de casa. Pegou um bocado e começou a amassá-la. Primeiro com ternura, sentido-a fria e úmida. Depois começou a apertá-la com força. Quanto mais a apertava, mais a massa lhe escapava, pelos dedos. E mais os maus pensamentos lhe fugiam ao controle, como azougue, misturando-se ao barro. Aquela massa informe, fria e com odor de terra era gostosa de apertar. Podiam ocultar inclusive todos os segredos do seu coração, deixando que sua ternura represada se misturasse a ela. Depois veio o surgimento de uma forma. Alguma coisa nascia dali. No inicio temeu que pudesse brotar da argila algo disforme, que pudesse aumentar o medo de si própria. Mas sentiu que teria finalmente um controle sobre o que não queria moldar. Surgiu de suas mãos lamacentas a forma de um feto. Misturou novamente a massa retirando-lhe os pedaços em ritmo de rejunte. Apertava, beliscava, batia nela com ardor. Depois, moderando a ansiedade viu outra forma nascer e daí por diante em muitas outras noites de insônia, buscava beleza na harmonia e pureza das formas que brotavam de suas mãos. Busca interminável! Todas as peças que produzidas eram ensaios, nunca estavam completas. Ela não estava completa. Nada é completo.
Ali estava a explicação para sua mente perturbada: seu tormento havia-lhe conduzido ao encontro com os loucos que haviam habitado e existem numerosos e anônimos pelo planeta. Não estava mais sozinha. Era uma artista!

Nota: Gostaria de saber a autoria desta genial figura que ilustra o texto.

domingo, 28 de novembro de 2010

Nota

O Pivete foi escrito em 2006, por isto algumas referências ultrapassadas como Bush, FMI e outras.

sábado, 27 de novembro de 2010

Diante do que está acontecendo no Rio de Janeiro




O pivete

Maria J Fortuna
De repente o pivete apareceu em minha frente.
Eu nunca havia parado para olhar nenhuma criança daquelas nos olhos. O medo não permitia. Temos medo de crianças aqui no Brasil. Principalmente quando seus olhos estão vermelhos denunciando o uso de crack ou cola de sapateiro. De crianças que não são nossos filhos e netos, nem tampouco nossos sobrinhos, vizinhos e conhecidos. Uma mistura de medo, revolta e compaixão, tomou conta de mim. Que dificuldade tive para encará-lo! Ele tinha um olhar de fome... Fome de comida, escola, família. Fome de amor e justiça! Estava cheio de ódio! Dava um medo danado! Ódio da miséria e da fartura dos que tem e o que ele não consegue ter. Ódio da desconfiança sistemática das pessoas, de sua própria imundice corporal que o segrega. Sobretudo ódio de ter vindo a este mundo.
Sem saber a quem dirigir tanto ódio, arremeça-o, como flechas, ao primeiro passante que lhe nega uns trocados. Eu senti aquela descarga mortífera. “Cada flecha portadora de um recado: “Vai a puta que te pariu”,” Que se foda”, “Enfia no cu”, daí por diante... Pintados aqui e ali formam um exército sem CIEPS, grande sonho de Darcy Ribeiro, que Moreira Franco destruiu. Onde, certamente eles tornar-se-iam cidadãos. Mas o que vemos é oito milhões de desempregados com suas famílias famintas...
Quanto tempo teremos que esperar que pais de família que dantes eram pacíficos se tornem, de repente, feras ambulantes cheias de ódio, com seus filhotes largados ao léu, transformados naqueles pivetes? Com suas meninas prostitutas gerando outros filhos sem teto? Lembrei-me da matança da Candelária. As metralhadoras atirando naqueles corpos infanto-juvenis, sem nenhuma oportunidade de vida ou de defesa. Não eram os corpos de nossos filhos, netos, sobrinhos, pertencente à classe media. Eram crianças que incomodam. Que avançam em pessoas nos sinais, que derrubam gente para roubar. Infelizmente só assim conseguem um pão para comer. Ou drogas para usar? São os filhos do nosso país, sem cidadania. Crianças que não sabem como anda o PIB , ou o risco Brasil.
Só vêem ceia de natal em folhinhas e nunca tiveram uma alimentação digna do seu crescimento físico, o que não dirá o seu crescimento emocional, social e espiritual... Esses pequenos escravos da miséria não sabem o que lucram os banqueiros do país. A nossa economia não cresce, mas os Bancos têm lucros astronómicos! Só o Banco do Brasil, no ano passado, ( 2006) com um atendimento quase precário, teve um lucro de R$ 1.7 bilhões até o mês de Setembro. Imagine os outros bancos como Bradesco, Banco Real, etc... E nunca ouviram falar nos sonegadores de impostos. Talvez ouçam falar em ladrões do governo, mas não compreendem muito bem do que se trata. Eu fui trinta anos assistente social e sei disto. São seres completamente alienados e nem desconfiam de onde vem seu infortúnio e, mesmo no ódio, acabam conformando-se com sua “sina”.
Desconhecem, no entanto, que são fruto de um ramalhete nauseabundo. E que suas mães, quase todas adolescentes, a maioria moradora de rua ou prostituta de algum cortiço, vão parindo bebes sem futuro pelo Brasil a fora. Seres humanos que não conhecem seus pais. Digo, aquele que os gerou no ventre de sua mãe menina. E que, se conseguirem viver até os catorze anos, além de abusos sexuais e de outros tipos de violência, eles serão pais de nova fornada de pivetes, escravos dos traficantes da favela e nunca conhecerão os grandalhões do tráfego. Desconhece a política armamentista do Bush e outros buracos negros que trazem este tipo de fome cruel para o mundo!
Infelizmente a palavra de ordem no país é de submissão ao FMI enquanto os corruptos compram apartamentos em Miami e lavam dinheiro em paraísos fiscais. O lucro do capitalismo continua sendo o bem supremo. Por não saber dessas coisas, o pivete mantém seu ódio frio contra a população de classe média, que não sabe mais o que faça para se proteger. Principalmente os anciãos.
Somos o país de maior desigualdade social no mundo. Nós e a Índia. Além dos políticos corruptos e corruptores, temos religiosos hipócritas que amedrontam o povo humilde, pondo-lhes sentimento de medo e culpa para roubar-lhe o minguado salário dos que ainda tem um modesto emprego de salário mínimo. E pelos meninos de rua, nada é feito. Em nome de Cristo almejam o poder.
Latifundiários, empresários, banqueiros que vivem devastando o planeta, acabando com a Amazônia, se cuidassem de um só desses brasileiros sem cidadania... Crianças que são como rios poluídos, pequenas árvores arrancadas precocemente do solo, ou do seu tronco familiar, quando são espancados em casa e atirados na rua por se uma boca, já crescidinha, a mais. Mata incendiada por dor e agonia.
Somos uma fabrica de pivetes. A todo o momento sai mais de uma fornada deles. A cada recorrência do FMI virão mais impostos. Aumentam os desempregos, o atendimento social e a maior falta de expansão dos investimentos públicos. Com isto aumentam os problemas sociais. Não há pivete tipo exportação. Temos que arcar com todos por este triste preço...
Alguns europeus vêem buscar nossos meninos para serem seus filhos. Mas os recolhem em casa de caridade ou creches, ainda muito pequenos, mas não os que estão em nossas ruas.
Enquanto nossos jovens de classe média alta se alienam com drogas e com o lixo televisivo da Globo. Essas crianças – adultos precoces no mundo do crime – adoram os Rambos do tráfico e cheiram cola para esquecer a fome. Dormem debaixo de marquises e planejam assaltos. Com a loucura do capitalismo selvagem que não sabemos quantos filhos de família rica e bem alimentada tem olhar de pivete, olhar de fome, de carência. De repente eles têm teto, terra e educação. Vão até para fora do país aprender outra língua. Em muitos casos esses privilégios, fora a mesada, não pagam o bem supremo que não recebem – o amor.
Ah! Como eu gostaria que aquele pivete, a quem ousei encarar, soubesse do que se passa. De quem são verdadeiros responsáveis por sua miséria. Quem são para eles os adoradores do poder? Afinal é triste ser pára-raios dos olhares de revolta desses pequeninos e outros nem tão pequeninos, que cospem quando a gente passa.
Se aqui roubam para comer, imagino o que não seria viver num país culturalmente evoluído! Como se torna este sonho distante para eles anos luz... Só um milagre traria um bom prato de comida com todas as proteínas e vitaminas de que precisam. Roupas limpas, escola, teto, família... Enfim algo que lhes estimule o sentimento de pertencer a uma comunidade que os ame e os respeite como cidadãos.
Utopicamente pensei em ver aquele olhar transformado por tantas formas de alimento. Até ouvindo Noturno de Chopin, dançando sob as estrelas ao som de uma valsa de Strauss, sorrindo com os dentes brancos a amostra. Cheirando as flores silvestres. Com um olhar doce dos que conhecem o amor e a beleza!
Refletindo sobre as flores mortas da irresponsabilidade, quase pus um par de asas no pivete... Para que ele voasse através dos meus sonhos. Um pensamento tipicamente surrealista. Eu o vi virando índio em minha frente. Comendo mandioca e outras iguarias das selvas. Dançando as danças de louvor a Tupã e pescando nos rios de águas frescas da Amazônia. Caçando com arco e flecha, namorando uma mocinha da tribo. Sendo pai de curumins apesar de que estão dizimando nossos índios também. De repente ouvi aquela voz debochada, abusada:
- Tá olhando o que, dona?
Como não havia o que responder, acordei do sonho, repentinamente. Então sai de fininho respeitando aquele ódio todo e com muito medo ainda.
Ao chegar a casa escrevi na minha agenda:
Flor
Pedra
Menino sem pão
Poesia cega

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Eliane Accioly e seus Atravessadores






Conheci Eliane Accioly, psicanalista, poeta e artista plástica, nas minhas viagens pela internet. Na verdade foi a REBRA, rede de escritoras brasileiras, fundada por Joyce Cavalcante, que me propiciou esta aproximação feliz.
Encantou-me a criatividade manifestada em seus textos, cheios de realismo e ternura, como o drama das marés iluminadas pela lua cheia e, sobretudo, a postura de quem, diante de si mesma, se diz aprendiz:
“Cada aprendizagem um processo envolto em sentimentos, sensações, emoções. Minhas pegadas e marcas neste mundo. As marcas e pegadas de toda a humanidade em mim. Em cada micro aprendizagem o processo do risco e da magia de estar humana.”.
Esta celebração, no encontro, acontece cada vez que a gente encontra alguém falando nosso código ou linguagem. Assim começamos a nos enviar, mutuamente, e-mails que assopravam, aos poucos, a areia que cobria nossas identidades e íamos nos desvendando como conchas recém-descobertas, até então mergulhadas na areia de uma praia desconhecida. Afinal eu estava no caminho certo ao procurar alguém que afirma que “a arte é um jeito de conhecer e estar na vida”.
Fomos desenterrando as lembranças das nossas incursões pelos caminhos da arte. Uma hora a gente descobriu que curtia coisas semelhantes; em outra começamos a enviar, uma à outra, textos que guardávamos na gaveta, durante anos, para que fossem lidos e comentados por ambas. Tem sido assim desde então.
Descobri, em suas histórias, o espírito ancestral, mineiro e brasileiro, que iluminou Guimarães Rosa e que, uma vez lendo qualquer de suas obras, caio em encantamento tal como acontece quando ouço os sons da Festa do Divino ou contemplo algum quadro de Dali ou Portinari.
Os Atravessadores foi outra história...

Frequentando o seu blog, dei com fotos destes personagens coloridos que se movem no espaço expressando sentimentos. Não consegui perceber logo o que se passava, mas agora cada vez me encanto com suas novas posturas. Vejamos o que está escrito em seu blog sobre eles:
São seres cujos corpos são feitos de fios os mais variados: alumínio, plástico, novelo de lã, arame, cobre, fios afetivos, e ainda linhas de desenhos.
Eles andam em bandos, e nunca sozinhos.
Não são seres individuais, mas coletivos.
Os Atravessadores se manifestam nas mais diferentes formas. Podem aparecer como humanos, animais, anjos, demônios, ou como os ETs de Varginha. Esses seres pensam, sentem, constroem mitos e filosofias, são poetas, e têm olho de recém nascido. O mundo que os cerca está pronto há milênios, mas em cada olhar, para eles, um mundo novo se revela.
Os Atravessadores surgiram primeiro em desenhos, artesanais e outras artes plásticas, as palavras e textos são posteriores.

Por aí esta artista se expressa com formas e coloridos que, por si mesmos, contam a história do que vem se manifestando, através do tempo, no coração da gente. Em nossas longas travessias, que deixam pegadas e marcas.
Fico imaginando, em minhas utopias, o que representa para as pessoas uma artista tão inovadora, praticando a psicanálise. É da gente ter esperança!

Vai acontecer uma exposição dos seus quadros dia 01 a 07/12 de 13 as 18,00 hs no Espaço Contraponto - rua Medeiros de Albuquerque, 55 - vila Madalena - São Paulo - SP
Ótima oportunidade para conhecer suas obras

Blogs de Eliane Accioly: http://elianeaccioly.blogspot.com/ e http://elianeacciolypsicanalisearte.blogspot.com/

sábado, 20 de novembro de 2010

Uma voz em tom maior




Maria J Fortuna


Hoje, o ser eterno falou para meu ser finito:
- Você é maior do que a dor dos seus ossos.
Escutei a voz da Consciência, que habita meu corpo há mais de sessenta anos!
– Você é maior do que seu corpo, insistia.
Experimentei uma nítida sensação de estranheza, como se eu não estivesse ouvindo estas coisas pela boca dos que estão a par desta verdade uma vida inteira! Como se eu, já há algum tempo, não me sussurrasse estas palavras, quando as dores da vida se hospedam em meu corpo. Mas a voz falava em tom novo, em nova cor.
Tudo era tão simples como o ato de jogar miolo de pão aos pombos... Ao mesmo tempo tão bizarro... Quase ridículo, que tanta grandeza podia caber num corpo tão frágil! Mas não coube duvidar, ouvia a voz que insistia:
- Você é maior do que seu tempo cumprido e do que há de vir. Maior que suas fantasias... Maior que seu medo e pecados. Maior do que sua loucura!
Não. Não era fuga... Nem tão pouco magia... O que eu estava escutando era mais verdadeiro que a presença do sol na Terra. O que causa estranheza é que sendo tão maior do que meu corpo, ecoa e habita nele... Por que cargas d água estou neste planeta tão dilacerado, onde as pessoas passam fome e, quando comem, estão sujeitas, muitas vezes, a engolir venenos? Sujeitas a consequências das tragédias ambientais, que elas mesmas provocam...
O que este eu maior faz dentro de mim? Por quem me toma? Lembrei-me dos meus antepassados e de suas consciências frente ao perecível, a morte. Por que, mesmo assim, trazem filhos à vida? O que os levou a crer que eu, por exemplo, poderia sair-me melhor do que eles frente às limitações do tempo, ao inevitável? Por um acaso tiveram consciência de que eram maior do que eles mesmos?
- Você é maior que tudo isto... Continuou a voz interior.
Senti-me num circo, onde os maiores desafios de equilíbrio são mostrados em meio a uma festa, onde as pessoas perdem a noção do perigo! Num picadeiro, onde as coisas mais incríveis acontecem! Eu, voando num trapézio, de uma situação a outra, de uma emoção a outra, expondo corpo e alma ao perigo. Tendo que confiar em outro trapezista, que estende as mãos para me segurar, mas que pode falhar. Como domadora de leões fantásticos que me habitam o coração e que, quando rugem, deixam-me de cabelo em pé, frente a meus próprios desejos! Andando na corda bamba dos acontecimentos derrapantes do dia a dia... E o palhaço que sempre brota dentro de mim quando um risco maior aparece? E a platéia? Sem ela o circo não acontece. Ser expectadora de mim mesma... Enfrentar o picadeiro com galhardia. Um compromisso existencial de vida e morte... Pensei tudo isto...
E a voz persistia...
- Você é bem maior do que o perigo.
Quando uma vela está prestes a se apagar, pensei, a gente se junta à chama de outra que esteja próxima. E assim por diante... Mas se sou maior do que eu mesma, tenho essa luz própria. Mas onde está o gerador desta luz? Quem acendeu o eterno dentro de mim? Uma vez eterna, sou luz perene. Para isto há que eu esteja ligada a um gerador Maior cuja Luz sempre existiu...
Aí voltei no tempo e me vi pequenina no cais do porto...Fui receber minha família, da qual eu estava apartada fazia mais de ano... À medida que o navio foi se aproximando, eu fui experimentando uma felicidade tão grande no coração, mas tão imensa, que era quase insuportável esperar mais um pouco para abraçar meus pais e irmãos! Por pouco não me lancei nas águas escuras no cais. Foi uma das maiores felicidades que senti na vida! Naquele momento, no amor, tornei-me maior que eu mesma!
Todos os recados visíveis da Luz Maior nos são dados pela Natureza que destruímos. Pela inocência das flores, animais e crianças. Pelas alegrias dos encontros amorosos e do amor presente até nas dores do mundo.
Talvez seja por isto que eu e meus companheiros de jornada, estejamos neste corpo finito e perecível, mas com uma Luz maior do que nós mesmos. O objetivo cósmico talvez seja este: fazermo-nos entrar em estado de felicidade suprema ao regressar ao fogo de origem. Tornarmo-nos Um com Ele no Amor.
Assim foram aquelas horas da madrugada em que uma voz, dentro de mim falou, amorosamente, que sou maior que eu mesma e finalmente eu acreditei e confiei.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A menina da cabeça chata




Maria J Fortuna


Então, os extraterrenos, com queixo fino e cabeça chata, chegaram à Terra... Imaginava a garota, que se balançava numa rede, enfiando os dedinhos nos fiapos de linha soltos, que saíam da costura por pura velhice. Aí, um a um, foram aparecendo na porta da nave espacial. Havia uma menina entre eles, na fila de saída. Estava ali porque tinha a cabeça triangular, igualzinha à deles. Mas um dos cientistas da Terra, que estava recebendo os passageiros da nave, ao ver a pequena disse:
- Essa menina não é extraterrena, porque sua cabeça não é tão chata como a dos outros. Ela é daqui da Terra! Vejam a ligeira curva do seu crânio!
Daí, os cientistas chegaram à conclusão de que era verdade, porque no nordeste do Brasil havia muita gente de cabeça chata. E aquela criança, para eles, devia ser nordestina. A menina ficou muito feliz porque a cabeça não era tão chata assim, como diziam as pessoas de sua família. Pelo menos ali, em seu devaneio. Chamavam-na de cabeça de ceia de Cristo, quadro, queixo fino de agulha, daí por diante.
Não tinha culpa se no jogo genético havia puxado os familiares do pai cearense. Mas deu azar, porque os outros seus três irmãos tinham o rosto longo e a cabeça no formato como a das pessoas do sul, como sua mãe, apesar de maranhense. Só ela era daquele jeito... Por isso ficava confusa quando os tios e o avô diziam que ela parecia uma boneca de tão linda! Acontece que alguém lindo não tem a cabeça chata, pensava. Aí se formava confusão em sua mente enfumaçada de dúvidas.
Certa vez, a tia a colocou sentada na mesa, aos quatro anos, para arrumá-la. Havia sido convidada para uma festa de aniversário. Penteando-lhe os cachinhos, reclamava:
- Nada fica bem nessa cabecinha... Nem arco, nem fita, nem nada! Já tentei de tudo! Vai sem laço mesmo. Talvez uma fivelinha levante um pouco os cachos da testa... Aquilo ficou gravado em sua memória como anel real em cera.
Ela olhava as coleguinhas e via que algumas tinham a cabeça parecida com a dela, mas usavam lacinhos de várias cores e nem davam bola pro azar! Ou então usavam tranças, que ela gostaria tanto que a mãe fizesse em seus cabelos castanhos, mas que todos de casa falavam que, para ela, não dava... Mas na casa dessas meninas, todo mundo deve ter cabeça chata, pensava... Descobriu que o gato que aparecia no muro do quintal, também tinha cabeça de triângulo. Mas as orelhas disfarçavam a cabecinha chata. Por isso nunca mais deixou de gostar de gatos. Iria gostar deles até velhinha!
Um dia, a garota saiu de São Luis do Maranhão e veio para o Rio de Janeiro. Foi muito pior! Não tinha uma amiguinha de cabeça igual à dela! E ainda riam do seu sotaque. Ali sim, era uma garota de outro planeta! De tanto se convencer de que era diferente das outras criaturinhas da mesma idade, juramentou o “defeito” e, consequentemente, a exclusão. A coisa era de nascença. Morreria de cabeça chata! Tornou-se cada vez mais tímida! O que lhe dificultou à beça, viver entre os mortais.
Mas o que a menina não sabia, e ninguém explicou para ela, é que criança não vê essas coisas. Que o importante para elas não é ser negro, pobre, branco, azul, amarelo... Ter olhos oblíquos ou cabeça chata. Se forem felizes, todos serão bonitos! E que a família ia falar sempre de sua cabeça chata. Até quando ficasse velhinha. Havia nela, alguma coisa, além do formato da cabeça, que eles não perdoavam...

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

José Ângelo Gaiarsa faleceu e meu coração ficou muito triste...

Um dos homens mais lúcidos que conheci, em toda minha vida, faleceu aos 90 anos em São Paulo. Li alguns dos seus 30 livros e tenho gravado uma dúzia de fitas de palestras, entrevistas e programas de ajuda, principalmente às mães, onde sua mente brilhante falava a respeito de educação. Nessa época minha filha era menina e eu adorava ouvir a respeito desse tema, o que me elucidou bastante, e pude ajudá-la nas suas escolhas.
Fiz também vários Seminários sobre Corpo com ele. Foi quando li a Estátua e a bailarina e fiquei encantada! Vários dos seus livros são ilustrados por Salvador Dali, o mestre do surrealismo! Um deles, Inspiração e respiração, também foi muito significativo na minha formação, quando eu dava aulas sobre Consciência Corporal. Aliás as pessoas ligadas a dança naquela época, em Belo Horizonte, conheciam muito bem o Angelo.
Coincidentemente, hoje tirei do baú, uma crônica que escrevi sobre Maledicência, citando o mestre Gaiarsa no seu livro O tratado geral sobre a fofoca.
Gaiarsa foi introdutor de Carl Gustave Jung e William Reich no Brasil. Era psicanalista e ideólogo da revolução sexual.
Respiração, angústia e renascimento, estava em revisão quando, ele partiu para o andar de cima. Espero, ansiosamente, ter esta obra em minhas mãos muito breve


http://www.youtube.com/watch?v=lcWq-xh_poU&feature=player_embedded

Gaiarsa Fofoca

Dia do Poeta


Em tempos de eleição é sempre bom refletir sobre...


Voltando ao assunto...


Maria J Fortuna

Cada vez menos quero saber a respeito das maledicências sobre as outras pessoas que conheço ou que nem tive oportunidade de conhecer. Para que gastar tanta energia prestando atenção aos boatos, fofocas, desabafos mentirosos ou não, a respeito de terceiros? Com que propósito e interesse? Como não me indignar quando a coisa extrapola? Impressionante o número de pessoas que derramam cascatas de fofocas inúteis e perigosas envolvendo o comportamento de presentes e ausentes personagens com quem convivem.
Fico pensando como, com tanta riqueza de detalhes, alguém pode afirmar que fulano ou beltrano na mídia televisiva ou fora da mesma, é considerado um safado, cretino, bicha, sapatão, pedófilo, drogado e outros rótulos. Estas pessoas que falam tais coisas perdem um tempo precioso de vida útil, para se ocupar de um companheiro (a) de jornada desta tão limitada vida, neste sofrido Planeta! Ninguém merece! Para que o conchavo ao pé do ouvido, onde um mar de lama se desprende das bocas e tenta afogar a vítima, que fica completamente impotente e, às vezes, nem desconfia que seu nome rola em “boca de Matildes”? Ou... Como resultado da fofoca, vendo sua imagem denegrida por interesses escusos. Será que não se usa mais respeitar a ausência das pessoas?
A fofoca sempre esconde despeito, inveja ou “dor de cotovelo”... E sempre subtrai, não acrescenta nunca! O que melhora nossa vida ficar ouvindo ou falando do próximo seja ele quem for? E se espalha... Vai longe... Atravessa casas, ruas, cidades, países... Conforme a importância das pessoas em questão.
Fico pensando... Para que formar tão densa camada de desamor, atirando as próprias mazelas sobre um bode expiatório? Até quando vai existir a cegueira da ignorância? A maledicência é uma tentativa de desfocar e destruir a verdade das pessoas. Por causa disso muitas delas não conseguiram resgatar nem com a morte, as calúnias jogadas encima delas.
Ângelo Gaiarsa lançou um livro pela Summus Editorial, muito interessante, há anos atrás, que continua cada vez mais atual – O Tratado Geral sobre a fofoca, uma análise da desconfiança humana. Recomendo esta obra para todos. Já está na 14ª edição.
Quando eu encontro as moças que comentam sobre a vizinha que põe chifres no marido, penso no que elas invejam daquela criatura. Que algo mais terá a mulher comentada ou difamada? ... Com isso me afasto das maledicentes. Como não pensar que não seria a próxima vitima se eu inventasse de fazer amizade com elas?

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Lucidez




Maria J Fortuna

Os dias de outubro, no Rio de Janeiro, andam nublados. Estranhamente nesses dias nebulosos, tem me acontecido, interiormente, o contrário: A névoa, que me ofusca a percepção, se vai, e passo a enxergar pessoas e fatos com maior clareza. Quero dizer que tenho vivido, neste tempo, dias de grande lucidez! A lentidão, que provoca pensamentos pesados, é substituída pela limpidez de raciocínio, com cada vez menos esforço, para perceber o que anda acontecendo nos bastidores da vida. No correr do dia, a claridade se faz como sol do meio-dia banhando os becos da alma, outrora sem luz. Atingem-me insights, como faíscas luminosas! Até a memória, um pouco dançada pelos anos vividos, fica mais clara. Onde estão os fantasmas com quem tenho costume de conviver? Com certeza, a presença deles é sempre incomoda. Vão surgindo do nada e me apavoram desde os dias da infância. Expulsá-los não resolve. Aprendi a ser tolerante e a contemplar seu desfilar, em procissão às vezes macabra, de mau agouro, e a conviver com o absurdo. Aprendi, igualmente, a tornar-me expectadora de mim mesma, pintando as visagens* com cara de palhaço e arlequim, ou coisa parecida, para que se tornem suportáveis! Aí eles, os fantasmas, costumam ir embora. Mas em dia de lucidez não aparecem. A cortina do coração se abre e a luz se projeta em meu peito, garimpando o amor que está escondido nas águas do inconsciente. E como Guimarães Rosa: “qualquer amor é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura!” E amor é acolhimento.
Lucidez não é “presente de grego” dos dias nublados. É o abrir-se para si mesmo. Reecontrar-se. Reconhecer-se. Tornar-se coerente. É como se nuvens se retirassem da alma e não houvesse mais nada a camuflar. Mas é também desafio à consciência de que este estado abençoado pode levar a uma tremenda solidão, no seu apelo à coerência. Se não houver coragem, as nuvens ficam mais espessas, e nos especializaremos em fugas que podem durar a vida inteira!
Quando eu era criança, havia um quadro, na sala de estar, que representava Jesus sentado numa pedra, nas montanhas, à noite, muito triste, olhando para Jerusalém do Monte das Oliveiras, que aparece no plano abaixo. Eu ficava intrigada. Quem seria responsável por tamanha tristeza estampada no rosto do Mestre? Fiquei sabendo depois que estava refletida nele a consciência da sua Missão. E de longe contemplava Jerusalém onde seria crucificado.

“JERUSALÉM, JERUSALÉM, QUE MATAS OS PROFETAS E APEDREJAIS OS QUE TE FORAM ENVIADOS”
O preço da lucidez e da coerência é enorme! Muito mais quando nascemos em uma sociedade esquizofrenante, ligada ao consumismo, que faz tudo para que nos esqueçamos de nós mesmos e oferece mil artigos para que outra pessoa, que não está dentro de mim, vire robô consentido e se mascare, todos os dias, na fuga de si mesmo.

*Visage é usado para designar fantasma no Estado do Maranhão e vem do francês visage, que quer dizer rosto, fisionomia

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O Corpo acontecendo na Europa


O Corpo, é conhecido em toda Europa
As apresentações do grupo, sempre com a casa cheia, tem seus ingressos disputados na França, como acontece no Brasil.
As filas com antecedência de compra de ingresso são enormes!
Também... Olhem a qualidade desta arte brasileira!

Nas andanças pela Arte...





























Maria J Fortuna


Impossível para mim, no momento, escrever algo que não esteja relacionado com a minha recente visita a algumas cidades da Europa como Florença, Annecy e Lyon, onde minha filha se casou.
Então vamos lá. Algo que me deixou impressionada foi a presença de Trisha Brown , ícone da dança contemporânea, no Musée d´Art Contemporain em Lyon. Bailarina e artista plástica, esta mulher americana dança à medida que pinta seus quadros. A sua companhia de dança pós moderna, nasceu na década de 60. Época em que a dança moderna começa a dar seu grito independência. Tal revolução na dança, começou com Isadora Ducan, “ela foge das convenções associadas à significação e à dimensão psicológica do movimento”.
Foi a época em que a tomada de consciência do corpo e seus movimentos se expressa com quadros da vida quotidiana. Lembrei do nosso “Maria Maria” primeiro espetáculo do nosso famoso grupo mineiro de dança Corpo, em que a coreografia retratava toda a vida da mulher mineira que vive e morre na pobreza material. Com fundo sonoro de Milton Nascimento e Miguel Arraes. E a partir daí veio o incontestável sucesso que agora é internacional. Pois Trisha Brown é uma dessas revolucionárias da dança. Ela propõe uma coreografia em que o bailarino dança de costas para o público e outras inovações interessantes.


Meu encontro inesquecível com a Arte do francês parisiense Antoine Etex, se deu no Museé des Beaux-Arts de Lyon, particularmente as obras deste escultor me impressionaram muitíssimo! A escultura “Cain é as race maudits de Dieu” (Caim e seus descendentes malditos de Deus) (1832-1839) deixou-me completamente deslumbrada! Este autor romântico de esculturas notáveis tem seu trabalho imortalizado no Arco do Triunfo. Outros artistas magníficos na arte de esculpir estavam presentes como James Pradier com sua Odalisque (1841), Auguste Rodin com La tentation de Saint Antoine e outros. Na pintura Victor Orsel com “Moise enfant présenté au Pharaon” (Moisés criança apresentado ao Faraó) e outros.



A bienal de dança Encore estava presente em Lyon quando assisti o já citado grupo de dança de Deborah Colker que me trouxe tanto orgulho! E o Les Ballets de Monte-Carlo, numa apresentação belíssima, com coreografia Jean-Christophe Maillot, Altro Canto with Portishead, onde masculino e feminino, a principio, se desencontram. No palco homens de roupa feminina e mulheres com roupas masculinas. No cenário apenas velas que vão se acendendo, pouco a pouco à medida que as figuras vão se encontrando até redescobrir o amor . Coisa deste gênio da coreografia, Mallot. Para os amantes da dança no youtube tem uma pequena amostra: distahttp://www.youtube.com/watch?v=DdYJXuR7b_Mntes

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Como se veste a alma...






Maria J Fortuna

Em Florença, eu estava na fila para visitar a Galleria Degli Uffizi. Parecia uma Babel! Mistura de línguas e raças como eu nunca havia visto antes! Exceto quando fui visitar a Torre Eiffel em 2008. Todos na expectativa de contemplar a beleza das obras de autores medievais e renascentistas como Giotto, Rafael, Leonardo Da Vinci, Caravaggio e outros talentos. Então, me veio a seguinte observação: interessante como a alma se veste... e a questão: existe hereditariedade para a alma? A homeopatia unicista diz que sim. Os reencarnacionistas afirmam que a alma se veste das mais variadas formas desde sua criação. Mas há uma corrente que fala que reencarnamos na mesma família... Mas, onde está a matriz adâmica de quando a alma se vestiu pela primeira vez? Havia diversidade de tipos nascidos em climas de regiões diversas, com traços de sua raça original, como o turco que falava sem parar em minha frente e o japonês que carregava um guia enorme embaixo do braço, bem atrás de mim.
Quando consegui entrar no Museu, que naquele dia era gratuito - por isto a fila grande – ao contemplar as obras de arte, a questão continuou: onde dentro da alma, revestida pelo corpo fica o ninho da Beleza? O que provoca tal expressão do ser em obras de tal forma abençoadas? Por que alguém tem o dom de esculpir um David com tanta perfeição e outro “ O nascimento da Venus” com tanta poesia? A luz que banha a alma do artista, de onde vem? Qual a motivação que impulsiona alguém a passar anos aprimorando as linhas do sonho e pintando com cores tão harmoniosas?
Creio que, ao longo da escala evolucionista, um belo dia, o homem, como obra de Deus desde o início, sentiu em seu coração as primeiras fagulhas do fogo criador herdado do Pai, quando experimentou pela primeira vez a percepção do belo. Creio que aí passa a residir o Espírito Santo. Com o tempo, a labareda que não queima, mas ilumina, se propaga por todo seu ser vivenciando, com isto, o êxtase. E são momentos eternos, posto que a capacidade criadora continua a residir na alma quando a vestimenta se vai... E deixa rastros notáveis como nas telas de Da Vinci.
Estampadas nas telas do Louvre ou na Galeria Palatina, estão figuras obscuras e iluminadas, dramáticas e cômicas, belas e deformadas. Mas o extraordinário é como podemos sentir que há beleza no feio e feiúra no belo, desde que tenha sido criado com a chama interior que transcende nossa capacidade de compreensão.
Na fila para sair da Galeria, assisti à festa do mês da vindima, no centro de Florença. Carros de boi traziam garrafas bojudas e coberta de palhas de vinho acompanhado dos tradicionais “fiaschi impagliattimo .Observei como algumas mulheres com roupas de dama e camponesa têm rosto de Madona e alguns homens de Perseu, João Batista ou Cristo. O que estava estampado nas telas, eu podia ver pelas ruas estreitas de Florença. Haja vista que no coquetel humano, predominava a raça ariana, presente na maioria das obras de arte da Europa.
A alma se veste de infinitas formas, mas a Presença do Espírito só é percebida em seu centro – no Belo, para dizer melhor.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Deborah Colker e seu grupo em Lyon



Aqui em Lyon um coração brasileiro bateu mais forte quando assistiu a platéia francêsa delirar com a apresentação do grupo de dança da Deborah Colker! Técnica, graciosidade, precisão, espírito, beleza enfim! Tudo para sentir orgulho do meu povo com sua criatividade, mostrando sua arte.
Depois tive oportunidade de abraçar alguns bailarinos, coisa que no Brasil é um pouco difícil depois de um espetáculo.Não sabia que este grupo tinha em suas raizes a influência de alguem que me levou a dançar na juventude:Graziela Figueroa. Muito bom perceber seu traço na formação dos bailarinos da nova geração.
Enfim, fiquei com a alma lavada e em estado de Graça.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010






Amanhã, bem cedo, estarei voando para Lyon (França), para assistir ao casamento da minha filha Maria Fernanda. Com isto ficarei ausente do blog até o final do mês. Espero que meus seguidores continuem visitando Artes e artes, procurando crônicas, charges, poesias, notícias que escrevi nesses últimos dois anos...
Até a volta no inicio de outubro.
Um grande abraço a todos e até a volta!
Meu email particular é: mjfortuna@terra.com.br

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Em tempos de eleições sempre é bom repetir




Maria J Fortuna






É complicado lidar com nosso impulso, agressivo e provocante, de querer submeter ao outro nosso fundamentalismo interior. Tenho certeza de que toda resposta agressiva, desproporcional à realidade do fato, é fruto disto. Assim começam as guerras pessoais e se dilaceram os relacionamentos. É a sede do poder ter mais razão do que o outro e querer que seu desafeto seja também desafeto do outro. Onde está a percepção de tal absurdo, gente?
Quando teremos um pouco de sabedoria para um diálogo tranquilo? Partir pra cima do oponente com toda efervescência, como se os hormônios do corpo de repente pululassem, o sangue circulasse com enorme rapidez, e os pulmões se dilatassem não faz de ninguém um ser humano respeitável. A verbal fica abusada, grosseira, aguda como lança, querendo convencer o outro da superioridade de seus argumentos. Confesso que já fui assim na minha adolescência e um pouco como jovem adulta. Mas não tenho saudade alguma daquele tipo de indignação, dessa intolerância! Fiz pessoas que, poderiam ser hoje amigas, nunca mais querer olhar para minha cara. Salvo que talvez tenham se transformado de alguma forma, como aconteceu a mim. Quero acreditar de todo coração nisto. Mas nem todos crescem com a idade. A mim, soa ridículo, o vomitar de impropriedades desrespeitosas, no gritar e gesticular, ou escrever palavras venenosas, trazendo argumentos verídicos ou suspeitos, no caso de pessoas adultas. Quanto a mim, houve alguns retornos em que, eu e o amigo, conseguimos colar o fio partido da amizade, que ficou solto ao sopro do tempo. Houve renovação. Chegamos até a rir da linguagem predatória que usávamos uns contra os outros. Mas infelizmente para com alguns, não consegui remendar os trapos que restaram da antiga relação. Infelizmente, isto é fruto de alguma discussão provocativa e acalorada, quando no fundo a luta maior e não percebida, era contra a excessiva autoridade interna dos nossos egos feridos.
Ai do mundo se não houvesse indignação contra a injustiça social que assola nosso planeta! Graças a Deus, todos os dias sou possuída por este sentimento, mas a lucidez que adquiri com os anos, não tolera mais provocação e desrespeito. Tanto é que, em caso de discussão política, não dou nenhum crédito a candidato cuja campanha eleitoral se faz depreciando o adversário.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Para os que não leram














Olhares


Maria J Fortuna

Quando eu era menina, as freiras do meu colégio colocaram na parede do banheiro:
“Olha que Deus te olha
Olha que Ele está olhando
Olha que vais morrer
Olha que não sabes quando...”
Parece que o maior pecado que existia no mundo acontecia no banheiro. Fiquei com medo do tal olhar divino, que me agredia e congelava a alma. Que parecia vigiar até minha sombra e, muitas vezes, quando eu cometia algum pequeno deslize, vinha a frase fantasmagórica e ameaçadora: “Olha que Ele está olhando...” E ainda dizem que Deus é amoroso... Pensava eu. Acho que foi aí que adquiri enorme percepção daqueles que me cercam. Toda revelação está nos olhos. Esta leitura parece esquecida pela maioria das pessoas que acreditam mais no que ouvem do que naquilo que veem.
Cresci ouvindo dizer que os olhos são janelas da alma. É verdade. Os olhos da minha mãe eram de veludo, como os de Omar Sharif. Olhos bondosos, profundos, cheios de misteriosa forma de dizer que nos amava. Ela sabia transmitir, através deles, a linguagem da ternura.
Já experimentei o toque expressivo do olhar de quem tem um só olho, como foi o de um dos meus irmãos. Traduzia timidez, interrogação e tristeza. Um olho enevoado, mas com vida; o outro, da prótese, era intruso, com pálpebra aberta demais. Um acidente, que lhe deformou o rosto, levou-lhe o olho esquerdo, quando tinha apenas dezoito anos e era um belo rapaz! Daí manifestou psicose bipolar e, na fase da depressão, tudo o que queria era fechar o olho verdadeiro para dormir, enquanto que o esquerdo - o artificial, passava a noite inteira fitando o teto. Parece muito engraçado, mas não era.
Já o olhar do meu irmão mais velho era sempre de lado, quase nunca de frente. Era o chamado olhar enviesado. Nunca quis saber o porque daquele olhar, mas era inocente e eu achava divertido.
Minha irmã tem, até hoje, um aspecto inteligente ao mesmo tempo triste, no olhar que, às vezes, se torna desafiador. Há certa magoa boiando dentro deles, como se tivesse sempre sendo vítima de injustiça eterna.
Meu pai era um homem que se fazia de duro. Era implicante, às vezes injusto. No entanto, próximo a sua morte, seu olhar se modificou, desde que nossa mãe foi para o outro lado da vida. Quando entrei pela porta do seu pequeno apartamento, exclamou referindo-se a mim: - você está toda iluminada, minha filha. No que percebi pela primeira vez, amor em seus olhos!
O olhar das crianças é transparente como asa de libélula. A visão de um mundo colorido, cheio de bolhas de sabão. Quando eu era uma delas, não havia coisa que me encantava mais do que ver cores do mundo refletido naquelas bolhas! Eu ficava me interrogando por que elas acabavam tão depressa. As crianças, mesmo quando estão doentes ou foram maltratadas, tem olhar interrogativo, não compreendem a violência. Os adolescentes têm olhos de esperança, mesmo com ar de rebeldia
Olhos da maioria das prostitutas denunciam volúpia não consentida pela alma, mas que trazem o pão de cada dia. Olhar embargado, na maioria delas por uso de álcool e drogas, que lhe permitem fugir, mesmo por pouco tempo, de seus corpos alugados e macerados.
Já senti o arrepio de ser vista pelos olhos suplicantes do ser humano com fome. Não só de alimento, mas de amor e reconhecimento.
Algumas pessoas têm olhar fugidio. Elas me fazem sentir aflição. Parece que dentro do portador há algum culpa prestes a ser denunciada no fundo dos olhos. Talvez escondam alguma coisa até pequena, mas que a autoacusação velada transforma em grande.
Já me deparei com o olhar de um santo no elevador do Maracanãzinho no Rio de Janeiro. D. Helder Câmara estava ali, sorrindo feito uma criança. Olhar que lembrava estrela em céu escuro, anjo azul, nuvem branquinha, amor brincando de roda, simplicidade, despojamento, pureza.
Um dia tentei libertar um preso que estava tuberculoso, contaminando os companheiros de cela. Eu era uma jovem assistente social, estagiária. No cárcere, os olhares em revolta partiram como lanças em minha direção, quase uniformes! Havia um ar indecente, zombeteiro e debochado no ar. Olhos que pareciam despir, punir, cuspir e babar em cima de mim. Apesar de tudo, alguma coisa inóspita mexeu comigo. Cheguei a pedir perdão pela boa condição social e profissional que contribuiu para que eu nunca estivesse atrás das grades.
Durante longo período de nove anos, trabalhei no setor de Psiquiatria. A maioria dos “pacientes” tinha olhar vago, imbecil. Outros eram uma espécie de quebra-cabeça, cujas peças não se encaixavam. Havia o olhar correndo de um lado para outro, como azougue de termômetro. Durante uma entrevista, eu esperava longamente por um momento de lucidez que poderia ser doloroso, quando voltavam do muito longe, sabe Deus de onde... Lembrava a frase de D.Quixote de Cervantes: “Viver assim me mata; morrer me dá a vida”
Passaram pela minha vida olhares confiantes e desconfiados. Cheios de alegria, dor, medo, gratidão, desespero e esperança. Alguns trazem graça e bênçãos; outros só conseguem enxergar o lado obscuro das pessoas, como se proibido fosse ver a luz.
Que posso dizer do meu olhar no espelho? Quantas pessoas reconhecem o que sou e o que estou sentindo? O que pareço aos olhos do outro? E aos olhos de mim mesma? E quanto aos olhos de Deus? São tão terríveis como diziam as freiras?

terça-feira, 31 de agosto de 2010

sexta-feira, 27 de agosto de 2010










O lançamento da Antologia A cidade em nós, trouxe-me muito alegria! A primeira vez que sou convidada a participar em uma Antologia. O convite foi feito por Rosane Zanine, arqueteta, escritora e sobretudo poeta, que mora na Suiça. Ela reuniu nesta Antologia pessoas de vários países e linguas. São crônicas e contos em português, espanhol e alemão, prefaciada por Olga Lucia Obando, Doutora em Psicologia, escritora que assim se expressa no Prefácio do livro:

“La ciudad en nosotros como prosa poética es un hecho develado en la lírica. Ciudades como Berlín, Vilnius, Zurich, Stuttgart, Paris y San Luis de Maranhão, adquieren una potente corporeidad y presencia desde los sentires, las emociones, las pasiones del sujeto que narra y es actor de su narración. La ciudad devela ideologías, es casa, lugar del amor, la acogida, es recuerdo, historia y es también experiencia que invisibiliza, la de los borders en el cambio social, la del nomadismo, la de la deriva de personas en franca huida, es lugar en donde se consolida una sociedad del miedo, la situada dentro de entornos hostiles.

La ciudad es actor y escenario de la trama sobre la que se construye la narración es ciudad decantada. La ciudad de los Versos Urbanos es la ciudad de quien narra. Una ciudad enunciada, apelada y cantada líricamente. Es motivo de un hablante que expresa sus sentimientos frente a ella, como espacio en el cual discurre lo cotidiano, lo inesperado, lo deseado y lo no deseado.

La idea de la ciudad como imagen poética, como espacio subrayado de manera gráfica y metafórica, es tan diversa como los nombres de las ciudades que refieren los autores Baependi, São Thomé das Letras, Berlín, Perge, New York, Colonia de Sacramento, Santiago de Chile, Granada, Montevideo, Punta del Este.

Construcciones verbales deliberadas que nos develan representaciones e imágenes mentales sintetizadas en elementos racionales, sensoriales y emocionales, contextualizados en el devenir de cada narrador, que le permiten al lector tener una experiencia estética de lugares desconocidos.”

Para comprar este livro verifique na Livraria e Loja Virtual Asabeça se a obra está disponível para comercialização.
http://www.scortecci.com.br/home.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Para os que não leram...








A pressão do doutor

Maria J Fortuna


- Você viu o absurdo que o Presidente falou na ONU? Indagou-me do nada, o cardiologista que atende tia Lourdes. Apenas respondi que não.
Encorajado com minha aparente postura alienada e levando a cliente pra trás do biombo, a fim de proceder ao eletrocardiograma, continuou sua fala bem entusiasmado. Acho que confundiu meu silêncio com aprovação, só podia ser. E eu calada...
- Que vexame para o país! Este homem ter coragem de falar que a fome é responsável pelas guerras! Afinal a razão estava com o Bush, que deveria ter invadido o Iraque há muito tempo, sem deixar nenhum terrorista vivo por lá.
Fiquei espantada com aquele doutor que trata corações... O homem ia falando... Falando... E minha tia deitada esperando pelo eletrocardiograma, que apenas ensaiou começar. E gesticulava para lá e para cá, dando continuidade ao rosário de tolices.
- Vexame, continuava repetindo com outras palavras, como pode um homem sem cultura, representar o Brasil lá fora dizendo esta barbaridade! Onde já se viu? A fome justificando terrorismo! O mundo precisa de paz, mas com um monte de terroristas a serem exterminados? ... Não deveria ficar nenhum vivo! O onze de setembro foi um descalabro! O mundo precisa de uma resposta!
E o doutor estava passando de rosa choque ao rosto vermelho e eu calada, observando, e minha tia, quietinha, atrás do biombo esperando o “eletro”.
Em minha mente desfilavam cenas terríveis dos filmes do holocausto judeu. E eu ficava cada vez mais perplexa com o discurso inflamado do cardiologista, que é um deles. Eu vi a figura do doutor virar o próprio Ariel Sharon bem gordo, ocupando toda a tela da TV. (nada contra os judeus). E pensei nas atrocidades que rolam entre Israel e Palestina afora... E a chacina das crianças na Rússia? Saddan matando os curdos e Bush os iraquianos. Cabeças sendo degoladas e o nosso doutor de coração, incentivando a guerra e aprovando Bush como Salvador do mundo! Ali estava a expressão viva do que eu só leio nos jornais. E eu calada... Contemplando o ridículo daquela situação. E o imensurável absurdo de quem defende guerras e elogia carrascos. Ainda mais de quem, que pode ter tido algum parente trucidado pelo SS de Hitler. É de cair o queixo...
De repente, o homem já estava salivando muito, com o rosto meio que lilás E eu continuava quieta, na contemplação silenciosa daquela triste realidade. Apesar de que tal atitude já começava a despertar suspeita e incomodar o doutor. Afinal, havemos de convir que aquela situação inusitada em que eu e minha tia estávamos, era como assistir a uma peça de teatro do absurdo! Ali deveria acontecer uma consulta médica e não um desabafo tão ameaçador!
Finalmente ele começou a fazer o eletrocardiograma. Mas isto não lhe cortou a mofada fala:
- Onde já se viu isto? O mundo está entregue aos perdedores... Quem diria? Continuava o cardiologista, passando de cara lilás para roxa.
A estas alturas, eu já estava pensando no Gandhi. E nos pacificadores como Jesus, vítima de uma macabra engrenagem política e agora sendo usado para fazer política! Pensando em todos os fundamentalistas do mundo! Nas guerras santas, na Inquisição e até nos circos romanos com cristãos jogados as feras! Pensei coisas e loisas...
E o sujeito médico, com o estetoscópio no pescoço, gesticulando agora completamente roxo!
A conversa do doutor era de tal forma nazista que não dava nem pra querer romper o véu do absurdo. Então tive a feliz idéia de propor outro assunto, mais adequado à situação:
- Doutor, comprei este aparelho de pressão digital e gostaria de saber como funciona.
Puxa! Foi um alívio!... Finalmente ele entrou no clima da consulta, pensei.
- Hum... Murmurou, depois de um curto suspiro, a fim de se recolocar no ambiente do seu consultório. Vou colocá-lo em sua tia e a senhora observa como funciona.
Foi atrás do biombo, onde a velha senhora aguardava pacientemente, ainda deitada, o resultado do eletro. E colocou o aparelho em seu pulso.
- Hum... 12 por 6. Tudo bem! A senhora confere aqui, por favor.
A cor do rosto bem feito do doutor foi voltando aos poucos do roxo, ao vermelho e daí para o rosa choque, depois para o rosa menos forte... Mas ele ainda arfava, ainda estava emocionado com o tema de seu discurso, em que alugou nossos ouvidos para ouvir sua explosão tão insípida quanto inconsequente.
- Agora, para testar melhor, vou experimentar em mim mesmo o aparelho, falou com autoridade. E, sentado, colocou o aparelho no seu próprio pulso.
- A minha pressão está... Bem, um momento... Hum... 20!.....
E eu nem fiquei sabendo a mínima... Ele engasgou e não falou.
- Por que estou com a pressão tão alta? E fez uma cômica cara de medo e surpresa. Estava suando por todos os poros e repetiu o procedimento por mais três vezes!... E sempre dava o mesmo resultado.
E o rosto do rosa começou a ficar branquinho... O doutor estava passando mal.
Não perdi tempo:
- Pois é, doutor, se eu fosse o senhor não ficava tão emocionado com estes assuntos de violência... O senhor vê sua pressão, tá lá em cima! Ódio mata, sabia? E desci minha tia da mesa do eletro, finalmente.
Saí dali com uma estranha sensação de vingança. Pra falar verdade, eu realmente adorei a pressão alta do doutor!

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A dança de Zorba

Maria J Fortuna

Hoje, quando me vi às voltas com um dos meus desmoronamentos interiores, lembrei-me de um dos recursos que uso para reerguer-me: assistir ao filme Zorba, O Grego, da década de 60, que me tem resgatado nos momentos em que crio alguma resistência de passar por cima do que já está no chão. Isto quer dizer que não adianta fazer velório para o que desaba, mas por mais incrível que pareça, convém celebrar!
Todo o filme traz uma sequência de acontecimentos que se repetem no mundo das emoções, neste planeta azul. Há de tudo: crises, conflitos, preconceitos, etc...
A emoção vai desde o encontro de Basil, um jovem escritor em crise de criatividade, com Zorba, o grego que tinha o apelido de Epidemia, “porque espalhava o caos por onde passava.” A genialidade de Nikos Kazantzakis trouxe, através deste filme, um monstro de interpretação que foi Anthonny Quinn, emocionando-nos do princípio ao final. Sobretudo quando Zorba constrói um monotrilho para levar madeira à mina que Basil herdou do pai, e o belo projeto vai por águas abaixo. Diante daquele desmoronamento, o grego ensina o rapaz a dançar sua dor. Como o ensinou a ler a alma das mulheres, através do seu relacionamento amoroso com madame Hortência, a velha francesa proprietária do único hotel da localidade. E do incentivo que deu a seu “patrãozinho” Basil, para dormir com uma carente bela viúva, perseguida pelos homens da Ilha.
O relutante escritor, que costumava dar vida a seus textos, na realidade não sabia viver. Maravilhoso o momento em que Zorba conta a ele que, quando perdeu o filho dançou sua dor a noite inteira no velório. A dor era tão grande que sacudiu seu corpanzil, conduzindo-o aos passos da sutaki. No vídeo abaixo, o mestre, homem iletrado, convida o discípulo intelectual a dançar, pela decepção e tristeza na não consumação do seu projeto na mina.
Mostra ainda, a triste sina das viúvas vestidas de negro para sempre, sem nenhum direito a amar outro homem, naquelas ilhas gregas (tive o prazer de conhecer três delas). Ainda vê o empenho do grego, para salvar uma dessas viúvas, condenada pelo povo ao apedrejamento, por ousar ter coragem de deitar com um homem, após a morte do marido.
É uma película ainda em preto e branco, sem o belíssimo colorido no casamento do céu com o azul do mar, mas sem dúvida chama a atenção para o que se pode chamar de superação, que diz sim à vida, apesar de tudo!
Zorba é mestre da vida. Ensina como degustar uma bebida, comer algo que lhe dê prazer, saber lidar com o amor e o sexo e, sobretudo, ensina a dançar alegria e dor. Tudo o que um escritor intelectual, ensimesmado, medroso, precisa saber! Tudo o que nos faz sobreviver a um desmoronamento.

Anthony Quinn: Zorba the Greek's dance (1964)

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Em homenagem a Luiz Lyrio

Neste crônica poética, homenageio meu amigo

Canção da folha que cai




Maria J Fortuna

Desprendi-me, prematuramente, da árvore mãe e danço ao sabor do vento, que de calmaria, pode soprar forte em tempo que a natureza perde a paciência. Então bailo no ar, cercada de insegurança por todos os lados.
Pedi ao Pai que, pelo menos, me seguisse com os Seus Olhos, numa súplica de proteção. Que, não me perdendo de vista, permita-me pousar num lugar bom e não numa poça de lama. E se assim for, que me tire a consciência.
Em forma de Menino Jesus, sei que sou mais vista por Ele que, como menino, adora pisar em folhas secas para ouvir o barulhinho e fazer apito das mais jovens, para chamar outras crianças pra brincar. Só que nem sou folha seca, nem tão jovem para que me façam de apito. Se fosse menina, fazia-me de comidinha para dar às bonecas.
Em minhas nervuras, a vida ainda ali está, e elas contam a minha história genética,que talvez seja a explicação do meu desprendimento, tão prematuro, dos galhos de minha mãe. Nessas nervuras, está escrito um caminho confuso, fora dos padrões da árvore que me gerou. E de minhas irmãs que lá estão. Ali está o desenho do caos, sem rota, independente da minha vontade de ser, desde meus tempos de folha verde.
Talvez meu bailado, por falta de peso, seja tão bonito que Deus se compraza em assisti-lo! Devo, então, cumprir os ditames de minha imperfeição, que pode justificar a permanência nas mãos da insegurança, maneta de nascença.
Na verdade não há explicação. Não me recordo de ninguém que tenha me arrancado da árvore, se bem que tudo possa ser possível em tempos em que a memória não alcança. Ou que eu mesma prefira bailar no ar a encobrir tal fato.
Estou, portanto, totalmente à mercê do desconhecido: antes, durante e depois. Não faço tanta falta assim à grande arvore. Ela tem centenas de folhas! Por enquanto sigo bailando... O que é imperfeito também se cumpre, para que a perfeição apareça.
Um poema pode estar sendo escrito neste momento. Afinal os poetas são aqueles que mais têm convivência com o desconhecido e vivem plenos na alquimia da insegurança. Não seria impossível para os poetas, fazer versos sobre uma folha que cai fora do tempo, sem nem querer saber do motivo.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Monica enfeita poesias!



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Monica com seu gatinho


Todas as poesias de Maria J Fortuna, são formatadas por Monica Puccinelli que, com sua sensibilidade, consegue enfeitá-las como ninguem!

Visitem seu blog: Visite meu blogger
http://crescendo-di-va-gando.blogspot.com/
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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Luiz Lyrio nos deixou







Ontem, Prof Luiz Lyrio nos deixou. Ele, escritor de muitos livros, como "Nos Idos 68"sendo que o último:" Entre a morte e a vida" , revela a versatilidade de sua obra. Era um grande humanista tinha uma mente contestadora. De grande nobreza de espírito e capacidade de compreensão. Isto porque era sensível aos problemas do social e não se calava diante das injustiças e desmando que se comete neste País. Além do mais era poeta. E como tal permanecerá em nossa memória poética.
Fica uma lacuna. E a lembrança dele através de suas obras.
Aí está um pequeno trecho de um texto publicado em seu blog e uma poesia premonitória.

"A morte dá aos seres humanos a oportunidade de redimensionar as coisas e reconhecer a verdadeira importância delas. Quando morre um gênio, sua obra sobrepõe-se à sua vida pessoal, que perde completamente a importância. Aliás, a humanidade teria muito mais a ganhar, se, em vez de se interessar pelas fofocas sobre seus ídolos divulgadas pela grande mídia, procurasse conhecer melhor o legado deixado por eles."

AMOR COM LIMITES



Não.

Não me pergunte por quê.

Não me pergunte como.

Não me pergunte onde.



Também não me pergunte como é e nem porque é.

Não me indague porque às vezes dói, mesmo enquanto dá prazer.



Também não tente saber quanto vai durar:

se será eterno ou só um fogo de palha,

um caso, um ficar passageiro e inconseqüente.





Não posso fazer juras de amor eterno.

Minha eternidade pode durar apenas um dia, uma hora, um minuto, um segundo.

De repente um enfarte, um aneurisma, uma distração ao atravessar uma rua,

uma bala perdida (ou virtuosa),

um avião caindo na minha cabeça, desgovernado por um terrorista maluco,

e pronto!

Lá se vão minha eternidade e minhas juras de amor eterno.



Por isso, apenas curta o momento.

Aproveite o que é bom.

Beba o prazer, como o alcoólatra sorve seu primeiro gole, durante a recaída.



E nunca sinta culpa nem medo da perda.

Desapegue-se sempre que o apego causar-lhe algum mal.

Depois, quando passarem o medo e a angústia, apegue-se de novo.



É bom estar apegado.

É bom estar vivo de verdade.

É essencial estar amando.

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Sou alguem preocupado em crescer.

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